domingo, 12 de outubro de 2008

Sentença de Um Juiz Marginal

Segue a sentença de um juiz que escolheu ser maginal, quando por uma decisão resolveu não aquiescer ao curso comum das ideologias jurídicas, quando muitas vezes esse curso não manifesta a melhor razão para ser e, prover o devido objetivo que deve ser pautado toda construção jurídica; não pode a manisfestação do Direito ficar distante da intelecção humanística e moral. Deve todo arcabouço jurídico orientar-se pelo zelo e proteção aos direitos humanos, melhor e pragmatizado no conceito de dignidade humana, princípio demazido exaltado na CF/88, mas essa instrução diretiva, as vezes é recharçada diante da insensatez de muitos que se propõem à construção do 'Justo', sem contudo observarem as virtudes que são atinentes à essa conquista . leia-se o Artigo, que trás parte de uma sentença que põe materialidade na manifestação tão nobre que se denomina "justiça":

"Edna, uma pobre mulher, estava presa há 8 meses, prestes a dar à luz, porque fora apanhada portanto alguns gramas de maconha. Dei um despacho fulminante, carregado de emoção e da ira santa que a injustiça provoca. Talvez a transcrição ajude a responder as indagações que colocamos no início deste artigo.
Eis, pois, o despacho:
“A acusada é multiplicadamente marginalizada: por ser mulher, numa sociedade machista; por ser pobre, cujo latifúndio são os sete palmos de terra dos versos imortais do poeta; por ser prostituta, desconsiderada pelos homens mas amada por um Nazareno que certa vez passou por este mundo; por não ter saúde; por estar grávida, santificada pelo feto que tem dentro de si, mulher diante da qual este Juiz deveria se ajoelhar, numa homenagem à maternidade, porém que, na nossa estrutura social, em vez de estar recebendo cuidados pré-natais, espera pelo filho na cadeia.
É uma dupla liberdade a que concedo neste despacho: liberdade para Edna e liberdade para o filho de Edna que, se do ventre da mãe puder ouvir o som da palavra humana, sinta o calor e o amor da palavra que lhe dirijo, para que venha a este mundo tão injusto com forças para lutar, sofrer e sobreviver.
Quando tanta gente foge da maternidade; quando milhares de brasileiras, mesmo jovens e sem discernimento, são esterilizadas; quando se deve afirmar ao Mundo que os seres têm direito à vida, que é preciso distribuir melhor os bens da Terra e não reduzir os comensais; quando, por motivo de conforto ou até mesmo por motivos fúteis, mulheres se privam de gerar, Edna engrandece hoje este Fórum, com o feto que traz dentro de si.
Este Juiz renegaria todo o seu credo, rasgaria todos os seus princípios, trairia a memória de sua Mãe, se permitisse sair Edna deste Fórum sob prisão.
Saia livre, saia abençoada por Deus, saia com seu filho, traga seu filho à luz, que cada choro de uma criança que nasce é a esperança de um mundo novo, mais fraterno, mais puro, algum dia cristão.
Expeça-se incontinenti o alvará de soltura”.
Edna encontrou um companheiro e com ele constituiu família. Mudou inteiramente o rumo de sua vida. A criança, se fosse homem, teria o nome do juiz, conforme declarou na audiência. Mas nasceu-lhe uma menina que se chamou Elke, em homenagem a Elke Maravilha.
Onde estará Edna com sua filha?
Distante que esteja, eu a homenageio. Pela tarde em que a libertei, por essa simples tarde, valeu a pena ter sido juiz.



Leia "Escritos de um jurista Marginal" de João B. Herkenhoff

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