domingo, 24 de agosto de 2008

Meditações do Náufrago para a vida.

Hoje assisti novamente um filme muito virtuoso e denso em conjecturassões do sentido e valor da vida, refiro-me ao Náufrago, filme que é estrelato por Tom Hanks (2000) onde obteve a quinta indicação ao Oscar, retratando a istória de um homem que fica perdido em uma ilha após um acidente aéreo, e depois de muito tempo retorna a civilização quando é resgatado por um navio cargueiro. O leitor deve estar se perguntando – “Não é um pouco tarde para o apreço de um filme ora tão batido e revolvido?”, sim meu caro, não ousaria dizer o contrário, mas apesar de ser um filme que estreou no século passado, ele ainda tem grandes repercussões filosóficas e morais que merecem um breve esquadrinho, e sem a pretensão de esgotar as implicações axiológicas e semânticas que esse filme tem para nos presentear, é por suas entrelinhas que passo agora a meditar.

Náufrago faz-me olhar para o ‘eu’ que existe em mim, essa segunda pessoa que não nos deixa em momentos em que a reflexão vem à tona, aquele que indagamos quando ninguém mais poderia trazer-nos uma resposta satisfatória e convincente, ou quem nunca se pegou falando consigo em nome de dúvidas intermináveis sobre a posição a ser tomada diante de uma escolha intricada e decisiva para aquele momento de vida? Esse é um ato que a filosofia ou a ética, dependendo a luta pela titularidade científica, denominaria de “humano”, o que é diferente de “atos do homem”, pois estes são feitos involuntariamente, são biologicamente automáticos, como a sede, o calor, o susto, diferente daqueles que são produzidos através da intelecção humana, e concebidos pela inferência e raciocínio próprios dos nós homens dotados de capacidade de escolha e aferição do bom e ruim, apesar de que alguns da nossa espécie deixem margem para a dúvida quanto a infalibilidade desse entendimento, por estarem muito mais próximos dos macacos em intelecção como dizem alguns evolucionistas.

Mas o que me detém na análise do Náufrago é a intimidade que ele possue em escancarar de maneira explícita, as carências e fragilidades humanas; fica muito nítido como somos perecíveis, limitados pela nossa própria natureza e nada temos sobre controle, nem mesmo podemos definir o dia do calar de nossos olhos. Praticamente tudo está fora do nosso domínio, ainda que máquinas terríveis pareçam se ordenar pela nossa vontade, nada temos senão a pressão sobre o botão da incerteza e inconstâncias humanas. As riquezas, o poder, a influência, a beleza, não podem estirpar as dores do mundo; a fome, a guerra, a solidão, as doenças, todas essas coisas se nos impõe como limitadores da nossa própria ignorância, que as vezes nos faz esquecer que a arrogância e prepotência, são as qualidades que farão sentir dó te ti mesmo, quando as debilidades da vida te fizerem ver que toda a tua vaidade de nada serve quando o seu corpo se transformar em pó.

Superações, sim o homem ainda é capaz de alcançá-las, mas há uma barreira que tem que ser deposta para o amanhecer da vitória pela transposição dos obstáculos dessa vida. Muitos se cansam e param a margem do caminho, não entendem que a adversidade é a tempestade mais difícil da vida, mas é ela a mais importante substância para forjar uma estrutura incorruptível e um caráter inabalável, capaz de respeitar os fracos, reconhecer a honra e desfrutar a recompensa; ela te prepara para ser grande e alcançar patamares mais altos, sem perder o controle, dirigindo tudo sabiamente.

Perdas, elas são em muitas situações irreparáveis, mas se tem algo capaz de fazer a revolução de atitude no homem é o experimentar da subtração a qualquer bem indisponível e insubstituível, muitas vezes nem sequer sabemos o real valor que as coisas ou pessoas tem para nós, mas isso logo se passa quando a perdemos, é o que ocorre quando se ouve a expressão tão usual, “só damos valor àquilo que perdemos”, e que pena que tenhamos que funcionar por esse sistema de reconhecimento tão cruel e irretratável, mas não há liberdade mais valorada do que aquela que é devolvida ao ex-prisioneiro que retorna às ruas após anos encarcerado injustamente.

Contudo o que mais me trouxe grande sensibilidade e me fez refletir ao assistir esse filme é a sensação de recompensa pelas coisas simples e práticas da vida, como é grande o valor das pequenas coisas para a nossa existência, e só percebemos a grandeza das minúcias quando já não as temos mais; tudo parece tão comum e substituível quando há fartura demasiada, as coisas não têm tanto sentido enquanto estão a nossa disposição voluntariamente, a água, o cobertor, o teto, os amigos, a paquera, tudo parece ser parte de um conjunto mecânico e volátil daquilo que estamos empapuçados e já não damos tanta atenção, pois é ordinário ao nosso viver.

A lição que aprendo hoje, após tantas divagações a respeito do sentido e valor das experiências para a vida, é que não quero estar tão desatendo aos mistérios e grandezas que se escondem nas manifestações mais corriqueiras que nos envolvem diariamente; Náufrago me diz para reconhecer o valor das coisas que tenho, enquanto ainda as tenho, porque amanhã pode ser tarde para reconhecer a importância daquilo que já perdi; não devo desistir do amor ainda que todas as evidências sejam contrárias a sua realização, pois ele sempre vai viver e mesmo que pareça morto, renascerá como a fênix grega; vejo que é preciso lutar pelos sonhos e nunca desistir da voz que clama do coração, pois as atitudes do homem não podem ser orientadas pelos biótipos sociais, em detrimento da minha vontade, pois no fim vemos que abrimos mão daquilo que no fundo nossos sentimentos acreditavam, mas deixamos de lado aquela voz interna, para ouvir a reprovação alheia, daquilo que deveria ser dirigido unicamente por nós.

Náufrago é a representação da vulnerabilidade humana, da fungibilidade dos preceitos de vaidade, arrogância, ganância, altivez e prepotência; é o reconhecimento do valor das peças imperceptíveis que compõem a vida, é o apelo ao reconhecimento das oportunidades e chances de hoje que podem se exaurir amanhã; é o grito do amor que não desiste de nós, mesmo quando não o ouvimos mais; é a clareza que mostra que não devemos nos orientar pelo que acham ou dizem as pessoas, se gostarão ou não, porque no fim nada disso nos servirá, e teremos perdido a chance de viver uma grande história ao lado daquilo que o apelo social se dizia contrário.

BrunoMaximos 24.08.08 15:22

4 comentários:

Anônimo disse...

bruninho, nãoo prometir que ia vim aqui?! tá ótimoo o blog, to adorando os textos
adorei essa parte...

" a adversidade é a tempestade mais difícil da vida, mas é ela a mais importante substância para forjar uma estrutura incorruptível e um caráter inabalável, capaz de respeitar os fracos, reconhecer a honra e desfrutar a recompensa; ela te prepara para ser grande e alcançar patamares mais altos, sem perder o controle, dirigindo tudo sabiamente."

beeeeijossssss,
Aninha

Anônimo disse...

bruninho, nãoo prometir que ia vim aqui?! tá ótimoo o blog, to adorando os textos
adorei essa parte...

" a adversidade é a tempestade mais difícil da vida, mas é ela a mais importante substância para forjar uma estrutura incorruptível e um caráter inabalável, capaz de respeitar os fracos, reconhecer a honra e desfrutar a recompensa; ela te prepara para ser grande e alcançar patamares mais altos, sem perder o controle, dirigindo tudo sabiamente."

beeeeijossssss,
Aninha

Greyce Carol disse...

Quem entenderá o ser humano?? A filosofia? A ciência?
Há várias indagações referentes a nós que ainda não fomos capazes de responde-las , a única certeza que temos é que a vida um dia acaba.
Essa questão de dar valor as minucias pertencentes a nós é raro, a sociedade introjetou em nossas mentes que se não agradamos o grupo dominate devemos então mudar.Na realidade o Naufrago retrata o limite do ser humano, por ter como essência a sociabilidade, deparando-se com necessidade de criar um personagem fictício ( Wilson) para sobreviver e manter a atividade intelectual senão morreria com certeza.
Bruno, gostei das suas reflexões...são inteligentes...Até deu vontade de criar um blog...rs

Valeu... Graça e Paz
=)
Greyce Carol

Anônimo disse...

Hi Bruno,
Este texto sobre este filme não poderia estar melhor. Se eu soubesse escrever como você, escreveria a mesma coisa...
Sempre bom encontrar pessoas que saber externar tanta coisa boa de dentro de si.
Grande abraço

Myka
(Da TR...)

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